domingo, 5 de julho de 2009

O Estudo da SEDES

Na sexta-feira passada, foi apresentado no IV Congresso da SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) o estudo “A Qualidade da Democracia em Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos”. Este trabalho foi dirigido por Pedro Magalhães, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, e promovido pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e pela Intercampus. Os resultados principais conheceram bastante divulgação na imprensa, de acordo com o reconhecimento atribuído às associações envolvidas e aos seus membros e dirigentes.

Em síntese, encontrou-se pela negativa que os Portugueses têm baixa confiança nas possibilidades da diversidade na representação política; num acesso à justiça idêntico a todos os cidadãos e de que os eleitos correspondam às preferências dos seus eleitores. Pela positiva, apareceu que os Portugueses reconhecem a sua liberdade para “votarem em quem quiserem” sem se sentirem pressionados e que “as eleições funcionam como forma de responsabilização política”.

Estes resultados são muito relevantes e merecem ser reflectidos e discutidos. No entanto, devemos sabê-los enquadrar com precisão. É que este trabalho não é propriamente um estudo sobre a qualidade da Democracia em Portugal, como algumas reportagens e comentários parecem querer demonstrar. Isto, porque os seus dados não são indicadores estrutrais ou funcionais do nosso regime. Eles são sim índices sobre a percepção, opinião, sensibilidade ou grau de satisfação dos cidadãos Portugueses.

E do mesmo modo que não podemos tornar equivalentes os sentimentos de insegurança das populações com os índices reais da criminalidade, aqui não podemos realizar inferências directas de uma dimensão da realidade para a outra, do que é percepção para o que é real. Ou melhor, podemos fazê-lo, mas aí já não nos encontramos no terreno das ciências sociais, e teremos dado o salto para o da ideologia.

Por exemplo, eu reflicto sobre estes dados de uma maneira muito mais optimista do que aquela que tem sido veiculada na comunicação social. O aparente sentimento de descrédito da população Portuguesa, seja no acesso à Justiça ou na bondade dos políticos, é fruto de um elevado nível de exigência, aquele que os cidadãos das sociedades Ocidentais contemporâneas guardam geralmente para com os seus sistemas de poder. Afinal, e de acordo com as referências deste estudo, os próprios Espanhóis duvidam, e na mesma medida que os Portugueses, da aplicação igualitária da Justiça no seu País.

E convenhamos, nós, Portugueses e Espanhóis, neste como noutros domínios devemos congratular-nos com a posição priveligiada de que dispomos, quer em relação às sociedades de muitos outros Países, quer em relação às sociedades dos nossos Países de algumas décadas atrás. Claro que tudo isto são reflexões ideológicas, julgamentos de valor, mas tão defensáveis como perceber aqueles dados como índices da degradação da Democracia em Portugal.

Não estou a diminuir o estudo, como disse, com dados muito interessantes, um trabalho sério que nos entrega um retrato provocante sobre o estado de espírito da Nação. Mas quero respeitar a essência dos seus dados, no sentido de os compreender melhor e discutir mais esclarecidamente.

PS: Para finalizar, gostaria só de referir que penso “A Qualidade da Democracia em Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos” como um projecto muito mais impressionante na óptica da Psicologia Política, do que na da Sociologia. Aí, penso, o estudo avança ideias muito curiosas sobre os factores ou características fundamentais à satisfação dos cidadãos com o seu sistema democrático e que, espero, possam vir a ser retomadas por estudos futuros.

Frederico

Vamos de comboio até à Questão: T(ambém) G(ostas) de V(erdade)? IV

O nosso melhor esforço só nos leva até a um certo ponto. Imaginem que, ainda cientes de que a nossa Verdade permanece um pouco longe do objectivo último inatingível, decidíamos partilhar visões, propostas, informação. Como seria essa incrível tarefa colectiva? Que conhecimentos e acções produziria? Que legislação ou políticas seriam levadas a cabo? Que emoções e recompensas enriqueceriam o nosso ser? O que seria de nós se todos colaborassem, nos seus máximos pessoais, para uma arquitectura e destino comuns?

Para cada um dos assuntos que nos afectam deveríamos poder emitir o nosso raciocínio e a nossa decisão. Haveríamos de dispor de uma enorme quantidade de possíveis soluções. Chegar a um conjunto único e refinadíssima, às nossas melhores hipóteses, ao nosso melhor esforço consciente e colectivo... Não porque seja reunido um consenso, mas porque emergem as mais robustas e meritórias propostas, as mais completas e ponderadas. Não haveria soluções perfeitas, mas as probabilidades de acertar aumentariam consideravelmente. E as dinâmicas criadas no entretanto só iriam fortalecer a resposta aos desafios vindouros. Em vez disto, perguntam-nos de 4 em 4 anos se somos rosas ou laranjas, nada mais, menosprezando toda a complexidade que nos vai na alma, rejeitando efectivamente o nosso melhor contributo.

I have a dream too. Um que até nos permite mentir à vontade como até aqui, economizar a actividade cerebral que é um mecanismo imprescindível, enfim, viver a vidinha ao gosto de cada um. Ao mesmo tempo faz com que a decisão das nossas vidas seja a mais consciente de sempre, traduzindo o sonho de resgatar um futuro mais risonho, mais próspero, mais pacífico e mais justo. É o sonho da Participação Democrática. Como sinto que ela está em perigo de desaparecer no tempo da minha geração, há que a agarrar enquanto ainda há a possibilidade de a ter e, mais importante, de a reconstruir...

Vamos de comboio até à Questão: T(ambém) G(ostas) de V(erdade)? III

Aquela premissa enunciada das Filosofia da Ciência, a da impossibilidade da demonstração de uma Verdade Universal nos mais variados tipos de assuntos, aparenta dizer que cada um de nós é potencialmente possuidor de Verdades Particulares. Já a versão quotidiana de nós precisa de acreditar, aderir psicológica e emocionalmente a uma visão, um grupo, um estilo de vida, posicionar-se a favor ou contra. Confiar ou não em quem me aborda. Sim ou não. Diabinho ou Anjinho. Verde-Lodo ou Amarelo-Vómito. Só. É isto que nos dão.

Portanto, a lição que nos resta retirar é a da aproximação à Verdade. Quão mais felizes seríamos se fôssemos, e chegássemos, o mais perto da Verdade que nos é possível, nos momentos certos? Decidir bem, no melhor das nossas capacidades, saber o porquê do acreditar e do agir, ter Fé. Não podemos deixar que os outros pensem por nós. As coisas importantes têm de começar a consumir-nos mais tempo. Porque é preciso tempo para investigar, estudar, observar, ler, ouvir o máximo de fontes possível. Possuímos pois um tempo finito para informar uma decisão (num esforço considerável para a pessoa) reunindo todas as perspectivas que podemos.

Qual seria então o momento de nos esticarmos mais do que nunca em direcção ao Esclarecimento? Que momento escolheriam? Faria parte do quotidiano ou da religião, ou das Leis da Natureza? Quereriam saber quem matou o Sá Carneiro, se existe um Deus, se o Reinaldo anda a comer a Frankfurt? Ou estariam interessados em definir e controlar um pouco mais o vosso futuro pessoal. Sonhar um destino colectivo que ajudamos a desenhar? Se a Verdade, que é só a de cada um, vai ser cuidadosamente afinada e integrada em outras Verdades complementares, será sempre preferível, creio, expô-la em território neutro, em condições uniformes, onde cada opinião tenha o peso que merece…

Identificamos então a oportunidade mais importante e flagrante das nossas vidas. Devoramos informação de várias disciplinas, variadas fontes, autores e agentes culturais, publicações e paradigmas científicos… Tornamo-nos melhores a distinguir informação bem produzida, coerente e reconhecida, em relação àquela puramente ideológica, pseudo-científica, corriqueira ou simplesmente falsa. Não foi isto que nos ensinaram? A apanhar um mentiroso mais depressa do que, salvo seja, um coxo? As nossas opiniões estão mais articuladas e lúcidas do que nunca. E, no entanto, só podem ser melhoradas.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Sophia

Faz hoje 5 anos que desapareceu Sophia de Mello Breyner Andresen, umas das maiores personalidades literárias portuguesas de sempre. Contista, poetisa, tradutora, activista pela Liberdade e figura de proa da grande cidade do Porto.

Foram suas as primeiras palavras que escutei com mais atenção, quando, por acaso e afortunadamente, a minha primeira professora primária leu à turma toda a “Fada Oriana”. Nunca revisitei o conto, mas aquela história marcou-me e, ainda hoje, consigo lembrar-me perfeitamente dos sítios, das cores, dos afectos e da magia. Durante o secundário, a sua poesia foi das mais belas que pude apreciar, juntamente com grandes como Sá-Carneiro ou José Régio, descontando o supra-sumo Pessoa. Por fim, há uns tempos li ao meu priminho umas passagens dos seus “Contos exemplares”.

Nada de extraordinário me liga a ela. Não sou seu estudioso, não me lembro da sua cara. Porém, vejo nela um exemplo de uma vida rica e completa. Sendo evidentemente um produto da sua época, pergunto-me o que ela poderia trazer consigo para o séc.XXI. Isto é, que qualidades à época seriam vistas enquanto tais em 2009?
Creio que isto é também especialmente dirigido às mulheres. Poderiam ver as suas acções e os seus escritos como material útil na vossa definição enquanto cidadãs, enquanto ser feminino?

Não estou à espera que me digam que, realmente, sempre quiseram ter aquela Formação Clássica “à muerte”, ou que estão empenhadíssimas a trabalhar no primeiro conto, que é assim, começa numa floresta e tem fadas... Isso é idiota e impossível nos tempos que correm. Num sentido geral, procuram saber de e aprender com esta e outras figuras do passado? Pode a Sophia dar sabedoria para enfrentar o quotidiano, medir aspirações ou temperar sensibilidades?

Vão já ao Facebook fazer o teste :P: Quanto de Sophia tens em ti?

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Vamos de comboio até à Questão: T(ambém) G(ostas) de V(erdade)? II

Diz-se, nos corredores por onde passo, que a Verdade não existe porque não pode ser cabalmente provada, mas tão só tangenciada. Estamos tão mais perto dela, quanto a buscarmos incessantemente ao longo de diferentes níveis de análise, da meta-física ou senso-comum, ao Conhecimento científico, e tudo o que está no meio. Em momentos particulares, as observações, testes ou hipóteses formulados podem falsificar uma Teoria, geralmente substituindo-a por outra com maior poder explicativo. Implica o teste contínuo às nossas crenças, o aperfeiçoamento tecnológico e sua prática, a substituição de modelos inteiros e teorias por outros mais funcionais, engenhosos ou eficientes. Esta concepção de Verdade expressa-se em inúmeros domínios, mas não na realidade imediatamente visível.

Esta outra realidade é baseada na outra corrente de Verdade. Aquela que não vê o Conhecimento como a espiral galopante que é, mas que nos condiciona a optar com base em experiências mais básicas, chamemos-lhe assim. Esta corrente é a dominante na esmagadora parte da nossa vida. Quem nos rodeia sempre teve o cuidado de nos ensinar “verdades”, de as distinguir claramente da "mentira". Em todas respostas que foram moldando as nossas “certezas”, existem mais do que a constatação dos “factos” e as estratégias de economia cognitiva que lhe subseguem. É que será sempre necessário o compromisso emocional. É aqui que se baseia a Confiança, que será depositada por nós junto daqueles que nos tentam influenciar. Sempre fomos chamados a posicionarmo-nos, mais ou menos subtilmente, sobre assuntos variadíssimos. No entanto, obriga-se na maior parte das vezes uma escolha clara entre dois pólos opostos, preto ou branco, positiva ou negativa, benéfico ou prejudicial, direito ou esquerdo.

Eu acho que as duas perspectivas são bastante complementares e contêm em si, uma enorme chave civilizacional. Sobretudo porque revelam que existem tantas visões do Mundo quanto pessoas, ao mesmo tempo reconhecendo que um ser humano é tão mais bem sucedido e recompensado quanto o seu padrão de verdade e círculo de confiança se aproxima daqueles que possuem Poder. Sempre terá sido assim, e a ingenuidade em nada ajuda para este caso. O ideal mais-do-que-utópico seria haver uma distribuição uniforme deste Poder; mas se conseguirmos nivelar completamente o terreno de jogo uma vez de x em x tempo, já será uma vitória enorme.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Vamos de comboio até à Questão: T(ambém) G(ostas) de V(erdade)? I



Notícias de última hora:


“O Governador X, da Tribo Amarelo-Vómito, pretende que Rectangulus tenha Linhas de Imensa Velocidade o quanto antes, indicando um painel reputadíssimo de especialistas que o apoia nesta proposta, classificando-a de moderna, indispensável e anti-CRISE. À nossa frente aparecem de imediato, nos inúmeros monitores que subitamente preenchem o nosso campo de visão, algumas dezenas de caras e vozes. Todas parecem concordar com o mesmo, mencionam os mesmos pontos fortes, têm uma clara coerência e uma articulação impecável. Têm o seu dom, mas aquilo é mais dos estudos. Os especialistas são mais bonitos, têm melhor imagem. Para além disso parecem mais credíveis, em larga medida, que os tribais.”

“A Arqui-Duque, da Tribo Verde-Lodo, pretende que Rectangulus não tenha, para já, Linhas de Imensa Velocidade. É melhor parar e estudar o assunto com o devido cuidado, tendo já reunido para o efeito um painel famosíssimo de especialistas, que classificam a obra como megalómana, inútil e louca (em tempos de CRISE). Acto contínuo, dezenas de outros estímulos invadem o sistema. Todos descem o mesmo rio, se possível no mesmo barco, repetindo ideias, palavras e frases de um e de outro. Forma-se um corpo de ideias compacto, resoluto e assinalável. Embora sendo menos bonitos, os tribais VL rapidamente se mesclam animadamente com os especialistas porque, para além de já terem estudado, ainda querem estudar mais e em conjunto. Estes especialistas parecem recebê-los de braços abertos.”



Eu tenho duas verdades, mas não tenho a certeza, de qual eu gosto mais.

domingo, 28 de junho de 2009

O Legado de Michael Jackson

Foi o acontecimento que porventura suscitou mais comentários e discussões nos últimos dias. No nosso País, apostaria que foram produzidas mais mensagens sobre o falecimento de Michael Jackson (1958 - 2009), que sobre a marcação da data das próximas eleições legislativas.

Talvez a várias pessoas cause estranheza, tanta comoção e alarido mediáticos. Nos dias de hoje, Michael Jackson não era uma estrela, muito menos a super-estrela que fora nos anos 1980. Essa já se tinha apagado há muito, e até num momento muito preciso – quando o “Rei da Pop” foi destronado das tabelas de vendas musicais pelo “Smells Like Teen Spirit” dos Nirvana (11 de Janeiro de 1992).

Não obstante, Michael Jackson é hoje justamente recordado. Aqueles que celebram a sua vida, reconhecem o seu enorme talento e influência, que marcou a cultura de uma época e determinou toda uma linhagem subsequente de artistas, na música, na dança e no video-clip. Os trabalhos dos canais musicais transpiram particular pesar e reverência. Afinal, Michael Jackson representa o seu passado mítico, aquele que definiu e maximizou alguns dos seus parâmetros mais importantes, especialmente na configuração do espectáculo visual como elemento essencial à constelação do artista musical (incluindo o video-clip, a coreografia, o vestuário, o mega-concerto).

Em 1992, quando actuou no Estádio de Alvalade, já não era o ídolo inconstestável da juventude; e isso, ainda antes de todos os escândalos a que sou nome foi sendo associado. Dessa maneira, eu e genericamente as pessoas que ainda eram muito novas na altura, nunca chegámos a conhecer o Michael Jackson super-estrela. Apenas “ouvimos falar” sobre o seu estatuto quase mítico e nunca igualado desde os primórdios da MTV. O que lhe conhecemos da personalidade, foi já uma caricatura, a personagem trágica-cómica – de certa forma, mais simbólica da decadência que da glória do entretenimento popular Norte-Americano.

Mas a sua influência perdurou e fez-se sentir até aos nossos dias. Particularmente, a partir do final da década de 1990, com o renascimento da música popular juvenil (o teen pop) e que se prolongou pela primeira década do século XXI, no formato do r&b electrónico. Britney Spears, Justin Timberlake, Beyoncé, Kanye West, Pharell... são, em maior ou menor grau, os herdeiros do Michael Jackson dos anos 1980. E, goste-se ou não, são eles as referências da actual cultura musical popular.

São eles o legado de Michael Jackson e, é especialmente por eles, que a super-estrela é hoje celebrada.